Mineração e Agronegócio no Brasil e no mundo – características, semelhanças e intersecção

Introdução

Quando pensamos em agronegócio, o que normalmente nos vem à mente é superlativo: latifúndios, grandes plantações se estendendo até o horizonte, colheitadeiras monumentais, exportação de containers e containers de commodities, grandes grupos econômicos, monocultura e assim por diante.

Uma breve pesquisa pelo termo “agronegócio” reforça essa ideia: as imagens que aparecem como resultado ilustram exatamente o ideal de latifúndio mencionado acima. Entretanto, agronegócio é mais do que isso. Ele também engloba as pequenas propriedades que circundam as cidades, os chamados cinturões verdes (green belts), que normalmente envolvem a agricultura familiar e que abastecem as nossas casas diariamente com frutas e hortaliças; engloba a produção de produtos orgânicos, sem o uso de agrotóxicos, um mercado que a cada dia encontra mais espaço dentro da atual onda de sustentabilidade; engloba uma extensa rede de distribuição de alimentos, desde as grandes centrais (Centrais de Abastecimento – Ceasas e seus congêneres estaduais, como a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo – Ceagesp), até as feiras de rua, movimentando a economia local; engloba o comércio de insumos agrícolas, tais como fertilizantes, adubos, sementes; engloba pesquisa de ponta, principalmente em relação a maquinário e em alimentos transgênicos; tudo isso dentre de outros inúmeros exemplos que poderiam ser citados.

É muito difícil, desta forma, pensar em um mundo sem o agronegócio. Os seus produtos estão presentes no nosso dia-a-dia e fazem parte na nossa alimentação. Do café da manhã ao jantar e até mesmo quando nos vestimos, nós dependemos do agronegócio. Quando abastecemos o nosso carro, lá está o resultado de uma complexa rede que envolve o agro. A madeira dos nossos móveis é um produto desse mesmo mercado.

O desenvolvimento das atividades agrícolas foi o grande responsável, no passado, pela fixação dos primeiros humanos a um determinado local, substituindo a caça e a coleta de alimentos e um estilo de vida nômade, permitindo o desenvolvimento de sociedades mais complexas. Hoje, a atividade prossegue com importância ímpar.

Na mineração não é diferente. O imaginário coletivo de pronto relaciona este termo a cavas colossais, caminhões de mineração repletos de rochas, grandes pilhas de minério estocadas em áreas extensas, navios e navios de commodities transportadas para outros países, barragens de rejeitos e pilhas de estéreis, garimpo ilegal e, mais recentemente, problemas e desastres de grande escala.

Porém, da mesma forma que no agronegócio, a mineração é muito mais do que isso. A atividade mineral agrega valor a um bem que, por si só, não gera riqueza alguma, pois as jazidas minerais, se inexploradas, não geram nenhum benefício, aproveitamento ou riqueza.

Além disso, muitas vezes a extração mineral é desenvolvida por pequenas e médias empresas que fomentam o desenvolvimento regional e local pois, ao contrário de outras atividades, a chamada rigidez locacional impede que a extração seja levada a cabo em locais diversos de onde a jazida está localizada. O minerador, então, necessita levar toda a infraestrutura para onde o recurso mineral se encontra, movimentando a economia e gerando diversos benefícios para a sociedade. Temos ainda muitas empresas familiares, cooperativas extrativistas e de garimpeiros (Permissão de Lavra Garimpeira. Garimpo ilegal faz parte de outra conversa), o que distribui de forma mais homogênea os ganhos da atividade, além de inúmeros geólogos responsáveis pela pesquisa e pelo conhecimento do subsolo do vasto território nacional.

Se é difícil imaginar um mundo sem agronegócio, igualmente o é sem a mineração.

Praticamente tudo que nos circunda é fruto, em algum momento, da atividade mineral, por mais que percebamos isso de forma mais sutil. Comecemos por aquilo que está sobre as nossas cabeças: a mineração é responsável pela produção dos chamados agregados da construção civil. Sem calcário, areia e brita, não há concreto. Sem o ferro, não temos vergalhões para estruturar as nossas casas. Os metais que usamos nas cozinhas, as pedras da bancada da pia, o piso e o revestimento cerâmico, a fiação e as lâmpadas, os pratos e talheres, os carros e motos, o metrô e os ônibus, os aviões e navios, o maquinário que produz nas fábricas, os insumos de produção como produtos químicos, os cosméticos, os fertilizantes da agricultura, os chips eletrônicos, água mineral, lentes de óculos, … Enfim. Se você estiver lendo este texto em seu celular, tablete, notebook, ou no seu computador, a mineração faz parte disso.

A mineração representa marcos tão importantes que separam fases de desenvolvimento humano da pré-história: idade da pedra lascada (paleolítico), da pedra polida (neolítico), do cobre, do bronze e do ferro.

Igualmente, os benefícios gerados para a sociedade atualmente são muitos. A começar pela geração de riqueza pela exploração da jazida em si, transformando uma reserva mineral em um recurso com valor econômico, toda a cadeia de beneficiamento envolve muita tecnologia e agrega cada vez mais valor ao bem final.

Este capítulo tem o objetivo de trazer uma visão resumida do regime jurídico da mineração no Brasil e demonstrar que há alguns mitos que circundam o setor, da mesma forma que ocorre com a atividade agropastoril.

Breve cenário econômico – mineração no Brasil e no mundo

Após um período de recessão global e de diminuição dos investimentos no setor mineral no Brasil depois do pico de investimentos de 2012-2016, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) prevê uma retomada do setor para o quinquênio de 2020-2024, crescimento este que vem sendo percebido desde o quinquênio 2017-2021, conforme tabela abaixo.

A mineração, no Brasil, desempenha um importante papel na economia. Em 2019, o País foi o primeiro colocado no mundo na produção de nióbio. Além disso, foi o segundo colocado no ranking de exportação de ferro, terceiro colocado em vermiculita e grafita, quarto em vanádio e quinto em bauxita. Também se destaca pela exportação de estanho, níquel, magnesita, manganês, cromo, ouro e rochas ornamentais, contribuindo para o ingresso de divisas na economia nacional, segundo dados do Ibram e do Ministério de Minas e Energia.

Com participação relevante na cesta de exportação nacional, os bens minerais (minérios e transformados) representaram, em 2019, 22,6% do total das exportações, atingindo a marca de 41,9 bilhões de dólares em bens até o corte parcial de outubro, contribuindo expressivamente para o superávit comercial.

Os principais destinos da produção mineral brasileira dos últimos anos foram a China, os Estados Unidos, o Japão, a Holanda e a Malásia.

A China é a maior consumidora dos bens minerais brasileiros, principalmente do minério de ferro, matéria-prima do aço. Nossa produção compete com a da Austrália e com a do Canadá, sendo que os teores de ferro contido no produto brasileiro são bastante altos.

Por outro lado, o Brasil tem dependência externa de carvão metalúrgico, terras raras e potássio, este último um importante insumo na produção agrícola. Os principais países que nos fornecem esses e outros minérios, como alumínio e cobre, são: China, Rússia, Estados Unidos, Austrália e Colômbia.

Conforme dados divulgados pelo Ibram, estima-se que, para cada emprego direto no setor mineral, outros 3,5 postos sejam ocupados indiretamente na cadeia de transformação mineral e outros 11 sejam relacionados a atividades alheias, mas que orbitam empreendimentos minerais, tais como hotéis, restaurantes, dentre outros. Em 2019, o setor contou com 199 mil empregos diretos, o que gerou 696 mil postos de trabalho indiretos na transformação, além de outros 2,1 milhões de postos de trabalho beneficiados pela atividade. Somados, os estados de Minas Gerais, Pará e São Paulo representam mais da metade dos postos diretos.

O Ibram avalia que as mineradoras tenham sido responsáveis por recolher cerca de 45 milhões de reais em tributos em 2019. Somando-se a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM – os chamados royalties da mineração), o valor representa 49,5 milhões.

Vários países traçaram seu desenvolvimento com o auxílio da extração de recursos naturais, como Noruega, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Reino Unido. É possível conciliar a atividade com boas práticas e, com isso, atingir um desenvolvimento considerável do país, elevando a qualidade de vida da sociedade.

Características da Mineração

Da mesma forma que no agronegócio, a atividade de mineração, no Brasil, é desenvolvida pela iniciativa privada, sendo regulada pela União Federal por meio da Agência Nacional de Mineração (ANM), recém implementada em substituição ao extinto Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

A Constituição da República estabelece que as jazidas e os demais recursos minerais são propriedade distinta do solo, pertencentes à União Federal, garantindo-se ao concessionário o produto da lavra.

É neste alicerce que se fundamenta todo o sistema jurídico que regulamenta a atividade. Sendo o bem de propriedade da União, o minerador deve seguir um procedimento que garanta um direito de exploração desse recurso. Normalmente, isso ocorre por meio de uma autorização de pesquisa mineral e, posteriormente, com a obtenção de uma concessão de lavra.

A atividade é regrada por meio do Decreto-Lei nº 227, de 28 de fevereiro de 1967, o Código de Mineração, e pelo seu Regulamento, o Decreto 9.406, de 12 de junho de 2018. À ANM, ainda, compete emitir resoluções para normatizar a atividade e fiscalizá-la.

Estabeleceu-se, também, o chamado princípio da prioridade. Com ele, aquele que primeiro fizer o requerimento de pesquisa de uma área livre é quem tem o direito de desenvolver a extração em tal área. É vedado, portanto, que um segundo minerador exerça a mineração no que é chamado de áreas oneradas por requerimentos. É permitida, contudo, a cessão de direitos de pesquisa e de lavra para outros mineradores.

Após a obtenção do alvará de pesquisa, que tem validade de até três anos prorrogável sucessivamente por igual tempo, o minerador deve iniciar os trabalhos para definição da jazida, sua avaliação e determinação da exequibilidade econômica de seu aproveitamento. Ao final dos trabalhos, deve preparar um relatório para, caso haja interesse econômico, requerer a concessão de lavra da jazida que foi por ele descoberta.

Aí surge uma diferença com relação a outras atividades particulares: o minerador só obterá a concessão de lavra se comprovar a viabilidade econômica da exploração da jazida.

Desta forma, não é facultado a ele, diante da livre iniciativa, empreender em um projeto sem viabilidade econômica, o que poderia trazer resultados desastrosos, mormente considerando que os recursos minerais são bens finitos.

Percebe-se que o minerador, com a pesquisa mineral, contribui com a União Federal para o conhecimento do subsolo brasileiro, pois todo o resultado das suas pesquisas deve ser compartilhado com a ANM. A pesquisa mineral, com poucas exceções, é desempenhada pela iniciativa privada.

Uma vez obtida a portaria de lavra, o minerador terá direito de extrair o minério dentro dos parâmetros aprovados no plano de aproveitamento econômico da mina, até a exaustão da jazida, momento em que deve realizar o fechamento da cava.

O produto da lavra é, ao longo de todo esse processo, comercializado pelo minerador ou utilizado em seu processo produtivo. Como a jazida é um bem da União, o minerador deve recolher a CFEM, além dos tributos usualmente devidos pela atividade empresária, como forma de compensar a União Federal pela exploração de seus recursos. A CFEM tem natureza de preço público, conforme doutrina majoritária.

Vejamos, portanto, que a participação do Estado se limita a regulamentar a atividade, verificando se os mineradores cumprem com os requisitos para desenvolver a pesquisa e a lavra, além de fiscalizá-la. A pesquisa e a lavra, por sua vez, são desenvolvidas diretamente pelo minerador.

Os riscos inerentes à atividade são, desta feita, todos assumidos pelo empreendedor. Diferentemente de alguns tipos de concessões tradicionais, em que há compartilhamento de riscos (como as Parcerias Público-Privadas utilizadas nas concessões de rodovias, por exemplo), na mineração isso não ocorre.

Estima-se que a cada mil empreendimentos de pesquisa mineral, apenas um tenha a perspectiva de se transformar em um projeto de exploração viável (Trata-se de senso comum dentre os que militam no setor mineral). Os custos, por sua vez, são expressivos. A pesquisa mineral envolve sondagens, levantamentos aerogeofísicos, ensaios laboratoriais, muitas visitas ao campo e bastante tempo. Quando um bom projeto é encontrado, o minerador ainda incide em mais custos até a implementação de toda a infraestrutura necessária para iniciar a fase de obtenção de lucros, que muitas vezes envolve a abertura de frentes de lavra profundas e de acessos para escoamento da produção, por exemplo.

Em razão dessa rigidez locacional, visto que um projeto de mineração só pode ser levado a cabo no local onde se localiza a jazida, o legislador entendeu por bem que a atividade deve prevalecer sobre outras que não dependam de característica similar, criando a segunda grande distinção com demais atividades econômicas.

Enquanto para a instalação de uma fábrica usual o empreendedor tem à disposição uma série de áreas de interesse, que poderão ser sopesadas diante de seus custos, proximidade com mercado consumidor e com a mão de obra local, facilidade de obtenção de insumos e outros itens, isso não ocorre na extrativa mineral. Assim, caso haja um conflito entre um projeto mineral e outro empreendimento, como atividades agrícolas, deve prevalecer o primeiro em detrimento do segundo. Ainda, o minerador tem direito de acesso à área de pesquisa e de lavra independentemente da vontade do superficiário, sendo a este garantida uma renda pela ocupação do solo, indenização por danos e, caso aplicável, participação nos resultados da lavra.

De forma muito sucinta, e obviamente sem o intuito de discorrer sobre todo o assunto, estas são as características básicas da modelagem jurídica da mineração no Brasil.

Agronegócio

Conforme descrito no item anterior, a atividade de mineração é uma atividade desenvolvida pelo setor privado. No agronegócio não é diferente. Se na mineração temos uma regulação estatal que orienta e tem o condão de fomentar a atividade, na atividade agropastoril não temos uma presença tão marcante do Estado como regulador da atividade em si, mas sim como fiscalizador, principalmente quando nos referimos às normas sanitárias, visto que boa parte da produção agropastoril tem como destinação a alimentação humana. Também há participação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), uma empresa pública, em pesquisas focadas no setor e desenvolvimento de cultivares.

A agropecuária depende notadamente do empreendedorismo de seus participantes. A atividade pode ser desenvolvida em áreas de propriedade do empresário, ou, então, em propriedades de terceiros, de que aquele detenha a posse.

O plantio e a criação de animais podem ocorrer em diversos tipos de terrenos e climas, o que confere mais opções de instalação do empreendimento agropecuário quando comparamos com a mineração.

O risco da atividade, de forma análoga, também é do particular. Desde a obtenção de financiamento para a atividade até a negociação pelo uso da terra, passando para o transporte e a venda dos produtos, não há participação ativa do Estado.

O protagonismo do setor privado é responsável por números relevantes. Segundo projeção da Embrapa, o Brasil hoje alimenta cerca de 25% do mundo e o setor agropecuário, em 2018, contribuiu com 21,1% do PIB e 20% da força de trabalho no Brasil. De um total de 164,23 bilhões de dólares de valor bruto da produção brasileira de 2018, destacam-se a soja (24,3% desse total), os bovinos (13,2%), cana-de-açúcar (11,9%), frango (8,8%) e milho (8,2%). O Brasil é o maior exportador mundial dos produtos acima, com exceção do milho. Os principais destinos das exportações do setor foram a China, a União Europeia, os Estados Unidos, Hong Kong e Irã.

O setor conta com participação relevante da agricultura familiar. 88% dos estabelecimentos rurais são desse tipo, sendo que metade deles estão localizados no Nordeste, e são responsáveis pela produção de itens como mandioca, feijão, suínos, leite e aves.

Todos esses fatores demonstram a importância do agronegócio brasileiro nos níveis doméstico e internacional.

Mineração e Agronegócio e o uso do território

Um aspecto que difere ambas as atividades é o uso da terra. Segundo estudos da Embrapa, a agropecuária é responsável pela ocupação de 30,2% do território brasileiro, o que contempla pastagens nativas e plantadas, lavouras e florestas plantadas. O estudo indica que, nos Estados Unidos, esse percentual é muito maior: 74,3% do território americano é destinado às atividades agropecuárias.

É natural que a ocupação do solo no plantio e na pecuária seja intensa, notadamente em países subdesenvolvidos e de grande extensão territorial, como o Brasil. A agricultura e a pecuária extensivas têm um custo menor, o que faz com que o produto final se torne mais competitivo. Além disso, diferentemente de países com pouco espaço no campo, o valor de terras rurais no Brasil é um atrativo para a prática extensiva. A título de exemplo, na pecuária intensiva, temos a exploração da atividade em pequenas áreas. Contudo, isso aumenta o custo da atividade, pois demanda uma mão de obra mais qualificada, gastos adicionais com alimentação do gado e uso de tecnologias dispensáveis quando comparado à pecuária extensiva.

Segundo a ANM, a atividade de mineração ocupa 0,62% do território nacional. Diferentemente das pastagens e das lavouras, uma mina ocupa uma porção diminuta do território, ao contrário do que poderíamos pensar de antemão.

Isso se dá porque a extração mineral está adstrita ao local em que a jazida é encontrada (rigidez locacional). Mesmo os maiores projetos de exploração ocupam uma parcela pequena do território, sendo que são a minoria.

Ainda, considerando toda a área do polígono que representa o direito minerário, normalmente apenas uma pequena fração de fato representará as frentes de lavra do projeto, e que serão efetivamente ocupadas pelo empreendimento. O restante permanecerá intocado pelo minerador.

O mapa abaixo demonstra que as minas consideradas de grande porte, com produção acima de um milhão de toneladas por ano, estão concentradas em uma pequena fração do território, notadamente no Pará e em Minas Gerais.

Percebemos, assim, que a atividade mineral possui uso muito menos intensivo de terras do que a agropecuária.

Uso da Mineração no Agronegócio

Como já foi mencionado anteriormente, a mineração possui grande impacto no ambiente do agronegócio. Minerais como potássio e fosfato são empregados como fertilizantes e o calcário pode ser usado como corretor de pH do solo.

O potássio merece destaque nesta abordagem pois, segundo a ANM, no segundo semestre de 2018, o Brasil aumentou a importação de potássio do Canadá em 79,3% e da Rússia em 100,2%, sugerindo o intenso uso desse importante insumo e destacando a elevada dependência externa que temos do material.

O Brasil é o 10º produtor mundial de potássio e ocupa a 11ª posição em termos de reservas lavráveis, restritas hoje aos estados de Sergipe e Amazonas. Contudo, há produção apenas no complexo Taquari-Vassouras, em Sergipe, cujos direitos minerários pertencem à Petrobras e estão arrendados para a Vale Fertilizantes, que foi responsável pela produção de 0,8% do potássio de todo o planeta, representando 5,44% do consumo interno brasileiro. O restante foi importado.

Outro produto da cesta de fertilizantes do qual não somos autossuficientes é o fosfato. A produção total do minério em 2016 foi de 33,4 milhões de toneladas, com teor médio 10,5% de P2O5, resultando em 5,8 milhões de toneladas de produto beneficiado. No total, importamos 1,7 milhões de toneladas de rochas fosfáticas no mesmo ano, e 7,27 milhões de toneladas de outros produtos, como adubos fosfatados.

A ANM avalia que as reservas brasileiras de calcário, que possuem uso tanto na construção quanto na correção de pH do solo, são relativamente bem distribuídas pelos estados brasileiros e representam ainda centenas de anos de produção, considerando-se o ritmo atual. Trata-se de um bem que não possui importação ou exportação, pois é distribuído de forma bastante uniforme ao longo do globo terrestre.

Entre 2012 e 2016, a produção de calcário oscilou entre 29.000 e 34.000 toneladas ao ano. Segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Calcário Agrícola (Abracal), o Brasil deveria consumir cerca de 90.000 toneladas do mineral por ano para uma correção de solo ideal, o que incrementaria a produção agrícola em até 60% sem o uso de novas áreas plantadas. Ainda segundo a associação, o setor agrícola vem desperdiçando recursos com fertilizantes, visto que uma calagem adequada do solo potencializaria a ação desses minerais.

Já com relação à vermiculita, de importante uso na construção e também na agricultura, temos autossuficiência, sendo detentores da 3ª reserva global.

Desta forma, percebe-se que não só há uma intersecção entre mineração e agronegócio, mas principalmente que a mineração é absolutamente necessária quando falamos em correção de pH do solo e também em sua fertilização e, consequentemente, no incremento da produtividade sem o uso de novas áreas. A produção nacional de fertilizantes, todavia, é insuficiente para satisfazer o consumo interno e, assim, dependemos de importações, em sua maioria do Canadá e da Rússia.

Benefícios da Mineração Responsável

A mineração, quando desenvolvida legalmente e dentro dos preceitos regulamentares fixados pelo Estado, tem o condão de trazer grande desenvolvimento para a sociedade. Além dos produtos que são obtidos com a lavra e das divisas que isso pode gerar, quer seja na movimentação interna da economia, quer seja mediante o ingresso de dólares oriundos da exportação, os projetos minerais podem empregar uma parcela relevante da população, principalmente de locais remotos, dinamizando a economia local e levando tecnologia e infraestrutura de forma bastante capilarizada.

Os royalties da mineração são majoritariamente destinados aos municípios afetados pela atividade mineral, que ficam com uma fatia de 65% do valor arrecadado. Os estados ficam com 25%.

Essa verba não pode ser utilizada para quitar dívidas e tampouco no pagamento de pessoal, mas pode ser utilizada na criação e manutenção da infraestrutura do local, como hospitais, escolas, parques, ruas e praças, culminando na melhoria da qualidade de vida da comunidade local.

Normalmente, quando da instalação de um grande empreendimento mineral, há um fluxo migratório na região. As jazidas levam anos e anos de exploração para seu exaurimento, o que garante uma fonte de emprego estável por longo período, atraindo mão de obra. Com a chegada dos trabalhadores, torna-se necessário para os governos municipais investir em infraestrutura básica, como criação de novos bairros e melhoramento dos já existentes. A parcela de CFEM destinada aos municípios pode auxiliar nesse âmbito.

Também pode ser mencionada a chamada licença social para operar, que pode ser definida como o engajamento das empresas com a sociedade à sua volta, de forma a estreitar os laços de confiança entre empresa e comunidade, deixando claro que os ganhos da atividade serão compartilhados pela comunidade local. Essa é uma abordagem que vem ganhando adeptos no setor mineral.

O exemplo contrário também é verdadeiro. Ao ignorar os preceitos da licença social para operar, muitas empresas se veem em uma situação delicada. Ter a comunidade local contra o empreendimento é um pesadelo para qualquer investidor.

Também é importante mencionar que a atividade mineral é, muitas vezes, desenvolvida por cooperativas de trabalhadores e de garimpeiros. No Brasil, destaca-se a produção de estanho, nióbio e ouro realizada por tais profissionais, conforme levantamento do Anuário Mineral Brasileiro de 2018, da ANM.

O garimpo legalizado constitui importante forma de obtenção de renda para populações que muitas vezes poderiam atuar no trabalho informal, ou mesmo na extração ilegal, de forma rudimentar e predatória para o meio-ambiente. As cooperativas, não raras vezes, se tornam tão profissionais a ponto de investir em capacitação de seus cooperados, obtenção de novas técnicas e, principalmente, recuperação de áreas degradadas pela mineração, dando uma destinação econômica e socialmente correta para tais parcelas do solo. Como o trabalhador está integrado com a comunidade local, normalmente há um grande apoio das forças regionais para que as cooperativas se fortaleçam.

Por outro lado, a atividade mineral clandestina é altamente nociva para o meio- ambiente, para a sociedade e para a riqueza do País. O garimpeiro ilegal não recolhe tributos sobre a atividade. Além disso, são empregadas técnicas rudimentares, muitas vezes com o uso de substâncias prejudiciais como o mercúrio, que poluem e se acumulam na cadeia alimentar, terminando por prejudicar a saúde dos seres humanos, além de não observar as melhores práticas da técnica correta para extração do minério.

Também há desmatamento considerável na atividade ilegal. Por não se sujeitarem às fiscalizações da ANM e dos órgãos ambientais, é comum a abertura de grandes clareiras em unidades de conservação sem a preocupação com a recuperação da área. Isso afeta todo o bioma da região, colocando diversas espécies de plantas e de animais em risco.

O impacto social do garimpo ilegal também é muito relevante. Muitos desenvolvem a atividade dentro de terras indígenas, onde hoje não é permitida nenhuma atividade extrativa mineral e nas quais a fiscalização é dificultada devido aos entraves para o ingresso de fiscais ou mesmo policiais. Com isso, frequentemente ocorrem conflitos entre garimpeiros e comunidades indígenas. No caso de índios isolados, ainda há a chance de transmissão de doenças e deterioração cultural dessas etnias.

Os garimpeiros ilegais, algumas vezes, “esquentam” o produto do garimpo em empresas de fachada, travestindo os recursos de uma aparente legalidade, o que viabiliza a comercialização dos bens minerais extraídos ilegalmente. Outras vezes, esses minérios deixam o Brasil clandestinamente, sem nenhum tipo de registro, caracterizando uma verdadeira usurpação do patrimônio nacional.

Conclusão: necessidade de educação da sociedade sobre os temas

Como foi possível perceber, a mineração é uma atividade absolutamente necessária para a sociedade na forma que a conhecemos. Praticamente tudo o que temos à nossa volta é, em algum momento, obtido por meio da extração de recursos minerais. Além disso, a importância dessa indústria para a economia nacional é significativa, seja no consumo interno, seja na exportação, favorecendo a balança comercial brasileira e o dinamismo da economia.

No agronegócio existe uma situação similar. É evidente a sua importância na produção dos alimentos que consumimos diariamente, no combustível que usamos e nas fibras que compõem as nossas roupas. Ainda, como forte exportador de produtos agrícolas, nosso PIB é intimamente impactado pelos bons números do setor.

Contudo, vemos pouco empenho dos atores em termos de divulgação e de conscientização da sociedade a respeito desses temas, notadamente no setor mineral. Alguns exemplos negativos que permeiam a atividade, como o rompimento de barragens e conflitos com comunidades locais, tendem a permanecer no imaginário coletivo por muito tempo e com muita força, colocando a sociedade contra os projetos mineiros de uma forma generalizada.

É necessário um esforço para demonstrar a importância da mineração para a sociedade, destacando-se os efeitos positivos da atividade quando desempenhada de forma consciente e responsável. Não é possível macular todo o setor mineral em razão de alguns poucos exemplos ocorridos recentemente – o que não quer dizer que as condutas não devam ser apuradas.

Entretanto, é preciso demonstrar que a mineração não é apenas a imagem traçada no início deste artigo: caminhões repletos de rochas subindo por uma cava de tamanho colossal. Ela também é a cooperativa de garimpeiros legalizada que trabalha com responsabilidade ambiental e social, bem como o geólogo que atua na pesquisa de campo, além dos pequenos produtores locais de materiais como rochas ornamentais e até mesmo as grandes empresas responsáveis que cumprem com a recuperação das áreas degradadas pela atividade, dando a elas utilidade econômica.

A mineração é essencial para a vida e contribui de forma significativa na geração de empregos em localidades remotas, levando tecnologia e fomentando a economia local. Esses pontos precisam ser enaltecidos pelos atores do setor (empresas e governo) com o objetivo de mostrar a mineração como ela realmente é: fonte de riquezas e vetor de desenvolvimento social.

Por Luiz Fernando Visconti e Caio Mimessi Fransani

Bibliografia

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